Importante: O autor não se responsabiliza por consequências causadas em decorrência deste artigo. Só mexa em aparelhos eletro-eletrônicos se for qualificado para tal.

O problema

Possuo uma TV Plasma da Panasonic, o modelo é TC-P50UT20B que, ao que parece, é uma tropicalização da TX-50VT20B. Eu gosto de TVs de Plasma graças à profundidade do preto que estas telas oferecem, mas confesso que gostava mais da minha antiga TX-P50V20B (a versão não 3D e não - muito -tropicalizada). Bom mas isso é história para outro artigo.

Da noite para o dia essa TV parou de ligar pelo controle remoto. Claro que troquei as pilhas do controle remoto sem sucesso. Também testei com um controle universal sem o menor sucesso. Para finalizar o diagnóstico eu apontei o controle remoto para a câmera do celular e é possível ver o LED IR (infravermelho) piscar. Se não é o controle remoto só pode ser a TV…

Aprendendo com a experiência (ruim) de outros

Seguindo o caminho padrão recorri ao oráculo e encontrei alguns relatos de pessoas com problemas similares em modelos de outras marcas. Os relatos eram sempre de que a TV parava de responder a qualquer controle remoto mas que funcionava perfeitamente ao ser comandada pelos botões no painel ou via algum aplicativo de celular (se a mesma for uma SmartTV e possuir esse tipo de aplicativo). Esse é exatamente o sintoma que a minha Pana vinha apresentando.

Minha experiência (ruim) com assistências técnicas

Com todas as informações em mãos eu abri um chamado na Panasonic perguntando se haveria algum procedimento para fazer o reset da TV uma vez que o procedimento descrito no manual faz uso do controle remoto - justamente o que não está funcionando. Relatei em meu chamado que já havia testado o controle remoto, trocado pilhas e usado um outro controle remoto e que esse não era o real motivo. No dia seguinte eu recebi uma reposta da Panasonic aconselhando-me a verificar as pilhas do controle remoto e testá-lo com a câmera do celular… Mas não foi exatamente isso que escrevi no meu chamado? Ao que parece existe uma doença epidêmica que acomete canais de suporte técnico; tal doença apresenta sintomas como ignorar o que é escrito pelo consumidor e responde-lo com respostas genéricas de algum manual. Em casos mais graves pode forçar o suporte a não responder. Contente-se se seu suporte responder mesmo que seja repetindo exatamente o que você descreveu.

Liguei em três assistências técnicas autorizadas, a primeira disse que o modelo era velho e que não teria peça condenando minha TV ao descarte. A segunda assistência ouviu todo meu relato e negou-me falar diretamente com o técnico, disse que o procedimento era eu levar a TV até eles e em até 7 dias eles me passavam um diagnóstico e orçamento. Insisti dizendo que a assistência ficava a 35 km da minha cidade e que eu gostaria de falar com um técnico para saber se havia possibilidade de eu levar apenas a peça defeituosa ou ele simplesmente encomendar a placa de IR e eu levar a TV só para trocar. Nada! A moça que me atendeu parecia estar falando com um E.T. que apareceu falando coisas que ela não entendia e queria a todo custo burlar o processo que ela seguia de forma tão correta. A terceira assistência foi quase como a segunda, mas a moça não pensou que eu fosse um “quebra protocolo” e, percebendo que eu entendia um pouco daquilo que falava, disse: “Olha, essas TVs não têm mais peça de reposição no mercado. O que fazemos é mandar a placa para um laboratório e eles verificam se há como trocar os componentes”. A palavra laboratório foi o que me chamou a atenção para o fato de que eu mesmo poderia verificar o que estava errado na placa de IR. Afinal de contas ali não tem nenhum CI elaborado, mas sim componentes simples como resistores, capacitores e sensor de IR (óbvio ddddduuuuhhhhh!).

Desmontando a Pana

Desmontar a TV não foi complicado, por sorte eu tive auxílio de uma parafusadeira pois tirar os 20 parafusos que prendem a tampa traseira ao corpo da TV seria um trabalho ingrato de se fazer na unha. Durante a retirada da tampa me deparei com um módulo estranho, olhado as inscrições no mesmo descobri tratar-se de um módulo Bluetooth. Porque diabos essa TV tem um módulo Bluetooh que não aparece em menu nenhum, muito menos em seu manual, permanece um mistério ainda por ser desvendado.

TV aberta ocupando meu sofá
O fato do módulo não ter certificação da Anatel causa-me a impressão de que é uma das funcionalidades capadas durante a tropicalização do modelo - mas porque colocar o módulo lá se ele não está funcionado? Bom, deixa isso para lá, a TV atende minhas necessidades sem que eu saiba para que isso está ali.

Retirados a tampa traseira e o misterioso módulo Bluetooth, a placa IR está a um parafuso de sair. A mesma placa é compartilhada por outras duas funções: o LED de ligado/espera e o sensor de iluminação usado pela TV para calcular o brilho aplicado ao painel quando o ECO Mode está ativado. A placa possui a identificação TNPA5602, que usei para pesquisar na Internet e descobrir que a placa toda custa US$ 10,00 no eBay mas que ninguém no Brasil tem a essa placa para vender. De fato a participação de mercado da Panasonic no Brasil não é algo que salte aos olhos e quando falamos em TVs de plasma a base instalada é ainda menor. Se não tem usuário não tem mercado para peças certo?

Desvendando o circuito

Sabendo que existe placa semelhante para venda, eu fiquei mais tranquilo de tentar arrumá-la e, em caso de desastre, posso encomendar outra. Mas para mexer na placa eu preciso entender o circuito. Meu amigo Alexandre do Tabajara Labs pegou uma foto da placa e desvendou parte do circuito para mim. Mas torturando um pouco mais o Google, o Pedro - outro amigo, conseguiu encontrar o manual de serviço de uma TV que compartilha a mesma placa. O circuito está abaixo com a parte do infravermelho em destaque.

Esquemático: destaque para o circuito do receptor infravermelhoEsquemático: destaque para o circuito do receptor infravermelho

Procurando o culpado

Utilizando um multímetro e com a placa IR conectada na TV eu comecei a medir as tensões. Primeiro a entrada Vcc, provavelmente normal pois o LED da TV brilha normalmente. Como esperado, o Vcc apresentava tensão de 3.3V mas, no pino Vcc do sensor de IR (círculo azul nas imagens) havia aproximadamente 0,72V. Isso indica que algo, o sensor ou algum componente vizinho, está derrubando a tensão Vcc. Pensei que o sensor poderia estar em curto ou algo parecido, mas esses sensores são bastante robustos e pelo circuito ele não está condenado a nenhum trabalho forçado. Foi aí que reparei nos capacitores de desacoplamento que ficam próximos ao sensor (destaques amarelo e vermelho no verso da placa). Meu grande amigo Alex sugeriu que um deles ou ambos poderiam estar em curto circuito devido a fadiga.

Frente PCB - destaques para Vcc sensor e R2542. O Sr. Foco não pode comparecerFrente PCB - destaques para Vcc sensor e R2542. O Sr. Foco não pode comparecer
Verso PCB - destaques para R2517, C2512 e C2521Verso PCB - destaques para R2517, C2512 e C2521

Para testar essa possibilidade eu desliguei a TV e retirei a placa depois descarreguei os capacitores para evitar danos ao multímetro. Colocando o multímetro na função ohmímetro e medindo os terminais dos capacitores esse deve apresentar resistência zero Ohm e ir aumentando, preferencialmente até indicar resistência infinita (acima da escala de medição). Porém eu obtive a leitura de aproximadamente 7,5O Ohms, isso significa que um ou ambos capacitores está com problemas, esse valor de resistência é muito baixo. Aliado ao resistor (R2517) de 47 Ohms (destaque marrom) entre Vcc da alimentação e o pino Vcc do sensor, forma-se um divisor resistivo entregando uma tensão mais baixa para o sensor. Calculando a tensão resultante desse divisor para Ventrada=3,3V, R1=47 e R2=7,5 temos Vsaída=0,45V, mais baixa um pouco que aquela que eu efetivamente verifiquei com o circuito ligado, talvez porque a resistência dos capacitores aumente um pouco quando eles estão energizados ou por erro de medida do meu multímetro. Curiosidade: o valor de R2 para que a saída seja de 0,72V teria que ser de aproximadamente 13 Ohms.

Reparando a placa

Se os culpados são os capacitores, qual deles? Ambos? Um palpite baseado na experiência diz que o capacitor de menor tensão (6,3V) tem mais chances de sofrer danos nesse circuito. Utilizando um ferro de solda eu retirei o capacitor C2512 (circulado em amarelo) e repeti a medida de resistência nele fora do circuito. Obtive aproximados 6 Ohms, de fato este capacitor estava danificado. Medi também o capacitor que ficou no circuito e obtive vários kilo-Ohms na leitura. Voltando a teoria do divisor de resistivo, com R1=47 e R2 agora valendo quase 1 Mega-Ohm, teríamos praticamente os 3,3V no pino Vcc do sensor. Testei a placa sem o capacitor de volta na TV. O circuito apresentou 3.3V no pino Vcc do sensor, apontei o controle remoto e este funcionou perfeitamente; a TV estava de volta à ativa.

Montei a TV sem o capacitor, como sua função é apenas de desacoplamento, sua falta não irá interferir (muito) no funcionamento do sensor IR. Não queria ficar sem TV por mais tempo e já estava de saco cheio de ter meu sofá tomado pela grande tela de 50” que inviabilizava qualquer um de sentar ali. E nem vamos falar no que poderia acontecer se alguém acidentalmente derrubasse o potinho de parafusos que estava ao lado, no braço do sofá. Quando eu precisar comprar uns componentes eu aproveito e coloco esse capacitor na lista.

Conclusão

Apesar do controle remoto não ser imprescindível ao funcionamento da TV, muitas configurações ficam impossíveis. O problema mostrou-se muito mais simples do que o prognóstico dado pelas assistências técnicas. Como em quase todos os problemas da vida, a fase de preparação e pesquisa tomou mais tempo que a execução; eu gastei algumas horas vasculhando a Internet por manuais e informações dessa TV, mais algumas horas discutindo o circuito com amigos e pouco mais de 2 minutos para retirar a peça problemática e testar o circuito. E como toda experiência na vida, valeu a pena cada informação absorvida no processo. Para mim o mais importante nesse tipo de situação é escapar da armadilha da obsolescência programada que nos impele a comprar produtos novos e jogar fora produtos que poderiam ter vida útil estendida.